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27.12.2016
Temer mente: reforma enfraquecerá trabalhador

O peru de Natal este ano veio salgado, fora do ponto para a maioria dos brasileiros. Um dos ingredientes desse sabor ruim veio na forma do Projeto de Lei 6787/2016, apresentado pelo governo Temer no dia 22 de dezembro, conhecido como Reforma Trabalhista.

O sentido geral do projeto é explorar ainda mais o trabalho dos brasileiros e brasileiras, garantindo aos empresários e especuladores melhores condições de aumentar seus lucros.

Projeto elaborado em gabinetes, sem participação real dos representantes dos trabalhadores e trabalhadoras, um de seus principais elementos é permitir que negociações isoladas, entre empresas e empregados ou entre setores econômicos e seus trabalhadores, se sobreponham à lei existente, mesmo em casos que signifiquem redução de direitos para quem vive de salário.

A embalagem do peru do Temer até que parece sofisticada, bonita, para os mais desatentos. Mas o fato é que a reforma representa um ataque à já frágil estrutura trabalhista brasileira e vai prejudicar a maioria, segundo análises da subseção Dieese (Departamento Intersindical de Estudos Socioeconômicos) da CUT Nacional, de dirigentes sindicais e de especialistas em Direito do Trabalho.

Mentiras ou balelas

A primeira mentira do governo, ao anunciar e defender o projeto, é de que as “centrais” foram ouvidas. A CUT e a CTB foram logo a campo para negar que tenham participado de qualquer conversa a respeito com a equipe do Temer. Havia, sim, dirigentes sindicais presentes ao anúncio das medidas no Palácio do Planalto. Mas estes, sozinhos, não representam o universo trabalhista brasileiro.

“Ao contrário do que disse o governo Temer, a CUT não foi chamada em momento algum para negociar mudanças na legislação trabalhista. A CUT é contra toda e qualquer retirada de direito da classe trabalhadora e lutará para que isso não aconteça. Não vendemos direitos dos trabalhadores”, afirmou o presidente da Central Vagner Freitas, em entrevista à Rede Brasil Atual. Em nota oficial, um dia antes, a CUT já havia feito a mesma denúncia.

Mais representação sindical?

Outra mentira, facilmente detectável, é a de que o papel negociador dos sindicatos vai ser fortalecido com a proposta do governo não eleito. O PL prevê que em toda a empresa que tiver mais de 200 trabalhadores será feita a eleição de um representante dos trabalhadores. Os candidatos não precisarão ser sindicalizados.

Como lembra análise técnica feita pela subseção Dieese da CUT Nacional, a maior parte das empresas ficará de fora dessa exigência. Segundo o IBGE, a média de trabalhadores por empresa no Brasil, em 2015, era de 27 empregados. O IBGE comprova: maioria das empresas tem menos de 200 trabalhadores.

O maior problema, no entanto, refere-se ao fato de que esses representantes não precisarão ter origem nas bases de sua categoria, pois a atividade sindical, conforme expressado no PL, é desnecessária.

“Isso vai abrir espaço para que as empresas, os patrões, possam usar de artifícios para escolher esses representantes”, pontua Vagner Freitas. “O representante tem de vir da base, escolhido por seus companheiros e companheiras de trabalho. Do jeito que o governo quer, isso poderá, ao contrário, ser feito à revelia do sindicato”, diz o presidente da CUT.

Intervenção nos sindicatos

Irônico é o governo que pretende destruir o legado trabalhista de Getúlio Vargas tentar usar de um instrumento de que sempre Getúlio foi acusado por seus detratores: manietar os sindicatos, intervindo nas decisões, com a ajuda das empresas. “Negociações têm de acontecer em condições de igualdade, e o resultado delas precisa ser aprovado em assembleia”, crava o presidente da CUT. O PL sequer cita a palavra “assembleia”.

O PL 6787 fala expressamente na “ultratividade” das futuras negociações. Isso significa, grosso modo, que as leis ou convenções e contratos coletivos anteriores podem ser revogados a qualquer momento, assim que as partes decidirem negociar.

José Aldo versus Vanderlei Cordeiro

O que o governo propõe (e que Temer chamou de “paz entre patrões e empregados”.) é algo como uma luta de MMA entre José Aldo e o maratonista Vanderlei Cordeiro de Lima. Ou uma corrida de maratona entre os dois. “É preciso haver condições de igualdade”, pontua Vagner.

Já o advogado trabalhista José Eymard Loguercio lembra que no Brasil ainda não existe lei contra práticas antissindicais, o que já permite a ação empresarial para enfraquecer e dividir os sindicatos. “O governo quer institucionalizar algo que não existe por aqui, que é a negociação por empresa. Isso vai fragmentar mais ainda a luta da classe trabalhadora. Nossa principal arma de negociação são as convenções coletivas, em que categorias ou setores inteiros sentam à mesa com os patrões”, avalia.

Inconstitucionalidades

Na opinião de Eymard, o fato de o projeto não ser mais uma medida provisória, que entraria em vigor imediatamente, “nos livra daquilo que seria o fim da picada”. Para ele, é preciso intensificar a pressão sobre o Congresso e fazer um amplo trabalho de conscientização dos trabalhadores para alterar pontos do PL.

Do ponto de vista do trâmite legislativo, ele crê que é preciso concentrar esforços em combater as inconstitucionalidades do PL. Uma delas é o enfraquecimento, ou o quase banimento, do papel moderador da Justiça do Trabalho.

Em seu artigo 611-A, parágrafo primeiro, o PL da Reforma Trabalhista cita, genericamente, o “princípio da intervenção mínima na autonomia da vontade coletiva”. Outra inconstitucionalidade flagrante, aponta Eymard, é o desrespeito à máxima de que as negociações devem sempre prever a melhoria das condições de vida em geral da população. “Nosso problema é que quem tem decidido o que é ou não constitucional é o STF”, alerta.

Irônico é o governo que pretende destruir o legado trabalhista de Getúlio Vargas tentar usar de um instrumento de que sempre Getúlio foi acusado por seus detratores: manietar os sindicatos, intervindo nas decisões, com a ajuda das empresas.

“O golpismo quer enfraquecer os sindicatos e precarizar ainda mais a vida do trabalhador e da trabalhadora”, diz Vagner. O projeto de Temer lembra o do general Ernesto Geisel, que em 1974 baixou lei que instituía o trabalho temporário e reduzia direitos. Naquele momento, o Brasil vivia o fim do chamado “Milagre Econômico”, com a explosão da dívida em dólar e a crise do petróleo.

“Hoje é a mesma coisa. A economia em baixa, uma crise política e uma instabilidade jurídica enormes não criam o ambiente de confiança para negociar uma mudança desse tamanho. O pacote é a cara do golpismo”, sentencia Vagner Freitas.

Antes que Temer tente mais uma de suas ironias sem graça, esclarecemos: PL quer dizer projeto de lei. E golpe quer dizer a derrubada de uma presidenta eleita pelo povo para instituir uma verdadeira avalanche para desconstruir a Constituição.

 

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